Cumplicidade na relação mãe, pai e bebê

Por Alline Nogueira Melo

O nascimento de um filho é considerado um acontecimento que redefine a relação dos pais, que antes era a única. Agora essa relação também precisará ser cuidada, pois a satisfação enquanto parceiros tende a ficar como plano de fundo. Acreditar na expectativa de que, após algum tempo, a relação volte a ser como era antes, é desconsiderar uma realidade: ser três é diferente de ser dois. Dentro do processo da parentalidade existem outras tarefas a serem construídas, é preciso investir na relação de pais e também na relação de parceiros (Duarte e Zordam, 2016).

A experiência ativa de ser o pai

Ser pai, atualmente, é participar de inúmeros aspectos do desenvolvimento do filho, como, alimentar, trocar fralda e dar banho, não mais se restringindo a apenas provê-los financeiramente (Duarte e Zordam, 2016). Essas experiências de cuidado, que assume juntamente com a mãe, permitirão ao pai viver uma relação com o bebê e facilitam seu processo pessoal de parentalidade (Jager e Bottoli, 2011).

Cumprir a função paterna e estabelecer uma união com o bebê, funciona como um facilitador para que exista uma relação de apoio entre os pais.

Diferente dos papéis estabelecidos na sociedade antiga, atualmente o pai é o agente principal de sua inclusão na relação com seu bebê. É um processo que inclui a aceitação dos limites de sua natureza de homem e a ampliação de seus recursos para procurar alternativas de cuidados com o bebê, como segurar, embalar, conter. Nesse processo de descoberta, é preciso que o pai pegue esse bebê, mesmo se não souber ao certo o que fazer, através dessa experiência a relação começa a ser construída (Jager e Bottoli, 2011).

A experiência inclusiva de ser a mãe

Tornar-se mãe implica em enfrentar diversas mudanças emocionais, psicológicas e físicas. Da mesma forma, seu companheiro também enfrentará transformações. Ambos pais têm necessidades específicas e poderão cumprir papéis parentais muito além do que se é esperado deles.

Quando a mulher permite maior participação do pai no cuidado do bebê e este sente prazer nisso, menos provável é o isolamento da mãe e maior será a satisfação da nova família. Isso ainda ajuda a evitar sentimentos como culpa ou ressentimento e a exclusão de um dos dois da relação (Jager e Bottoli, 2011).

A mãe poderá ser a incentivadora do pai, abrindo espaço para uma parceria, o que otimiza a qualidade de vida familiar e o relacionamento conjugal.

A postura da mãe como facilitadora desse processo é fundamental e já se inicia na gestação. Uma mãe que não possibilita a entrada do pai nesse processo não terá a participação deste, nem a implicação dele no processo de cuidados com o bebê. Quando está diretamente envolvida nos cuidados com o bebê, ela pode facilitar ou dificultar a aproximação pai-bebê e, consequentemente, a criação do vínculo entre eles. (Jager e Bottoli, 2011)

A cumplicidade dos pais para fortalecer a relação

A chegada do filho na vida dos parceiros pede uma redistribuição de recursos. Por algum tempo, poderão viver a experiência de ter menos tempo, menos comunicação, menos sono, menos dinheiro, menos liberdade, menos contato, menos intimidade, menos privacidade.

Por um lado, esses aspectos unem os parceiros enquanto pais, inaugurando uma nova satisfação, a satisfação parental.

Por outro lado, afasta-os enquanto cônjuges, sendo uma mudança difícil para a relação dos dois.

É esperado que nesse momento as atenções se voltem para o filho, que vai necessitar de proteção e segurança, mas é saudável que, após um tempo, o casal retome gradativamente o olhar para sua relação (Duarte e Zordam, 2016).

Enquanto o nascimento do filho tende a afastar os pais na relação enquanto casal, a cumplicidade que eles podem estabelecer entre eles através da realização dos cuidados com o bebê pode retomar essa proximidade perdida.

Quando, por exemplo, conseguem dar banho no filho juntos, talvez estejam criando um momento para se perceberem exercitando esse novo papel materno e paterno que adquiriram. Eles experienciam um tempo juntos, a mãe consegue olhar para o pai sendo pai e o pai consegue olhar para a mãe sendo mãe, algo que vai além do bebê e que só conseguem adquirir por estarem compartilhando o mesmo momento. É diferente do simples delegar uma tarefa ao outro.

“As coisas não parecem tão assustadoras quando se tem um grande amigo.” (Calvin e Haroldo).

Tornar-se pai é mãe é caminhar por um terreno desconhecido, antes e depois do nascimento dos filhos. As referências passadas não são mais suficientes para dar conta das demandas da parentalidade na atualidade (Bornholdt, Wagner e Staudt, 2007). E esse caminho por um terreno desconhecido se torna menos assustador para os pais quando conseguem ser cúmplices e compartilhar experiências.

Fontes de pesquisa e imagens
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  • Abuchaim, B. D. O. (2016). Importância dos vínculos familiares na primeira infância: estudo II. São Paulo: Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal.
  • Berger, K. S. (2003). O desenvolvimento da pessoa: do nascimento a terceira idade. LTC.
  • Bornholdt, E. A., Wagner, A., & Staudt, A. C. P. (2007). A vivência da gravidez do primeiro filho à luz da perspectiva paterna. Psicologia Clínica, 19(1), 75-92.
  • de Carvalho, J. B. L., de Brito, R. S., Araújo, A. C. P. F., & de Souza, N. L. (2009). Sentimentos vivenciados pelo pai diante do nascimento do filho. Revista da Rede de Enfermagem do Nordeste, 10(3), 125-131.
  • Duarte¹, E. D. L., & Zordan, E. P. (2016). Nascimento do primeiro filho: transição para a parentalidade e satisfação conjugal.
  • Jager, M. E., & Bottoli, C. (2011). Paternidade: vivência do primeiro filho e mudanças familiares. Revista Psicologia-Teoria e Prática, 13(1).
Alline é graduada em Psicologia, especialista em Psicologia Clínica Hospitalar e há quase dez anos pratica a psicologia com crianças, adolescentes e adultos através da abordagem psicodinâmica.